Órgão: Consultoria Tributária da Sefaz de São Paulo.

Resposta à Consulta nº 31.746, de 01/07/2025

RESPOSTA À CONSULTA TRIBUTÁRIA 31746/2025, de 01 de julho de 2025.

Publicada no Diário Eletrônico em 02/07/2025

Ementa

ICMS - Obrigações acessórias - Locação de bens produzidos pelo próprio contribuinte locador - Classificação do bem no ativo imobilizado do locador - Emissão de Nota Fiscal para movimentação de bens em virtude de locação.

I. A saída/remessa de bens em virtude de contrato de locação está fora do campo de incidência do ICMS (artigo 7º, inciso IX, do RICMS/2000), desde que tal contrato não seja desvirtuado para encobrir negócios jurídicos de outra natureza.

II. O código CNAE deve ser atribuído na forma prevista pela Secretaria da Fazenda e Planejamento com base em declaração prestada pelo próprio contribuinte, quando da sua inscrição inicial, quando ocorrerem alterações em sua atividade econômica, ou ainda, quando exigido (artigo 29, § 1º, do RICMS/2000).

Relato

1. A Consulente, contribuinte enquadrada no Regime Periódico de Apuração (RPA), que declara no Cadastro de Contribuintes do ICMS do Estado de São Paulo (CADESP) exercer, como atividade econômica principal, "comércio atacadista de instrumentos e materiais para uso médico, cirúrgico, hospitalar e de laboratórios" (CNAE 46.45-1/01) e dentre as diversas atividades secundárias, "comércio atacadista de máquinas, aparelhos e equipamentos para uso odonto-médico-hospitalar; partes e peças" (CNAE 46.64-8/00), relata que pretende iniciar a atividade de locação de produtos por ela fabricados, passando a inserir em seus dados cadastrais o código da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) relativo à atividade de locação de bens.

2. Menciona o artigo 7º, inciso IX, do Regulamento do ICMS paulista (RICMS/2000), entendendo que a saída e retorno de bens em virtude de locação está fora do campo de incidência do ICMS, desde que o contrato da operação não seja desvirtuado para encobrir negócios jurídicos de outra natureza.

3. Diante disso, apresenta os seguintes questionamentos acerca da atividade de locação de seus produtos para terceiro locatário localizado no Estado de São Paulo:

3.1. Após a inserção do código CNAE relativo à atividade de locação de bens em seus dados cadastrais, é permitido que atue nesse ramo, com locação de seus produtos para terceiros? O produto objeto de locação precisa estar classificado como bem em seu ativo imobilizado?

3.2. Na saída do bem para locação a terceiros deve ser emitida Nota Fiscal, sem destaque do ICMS, tendo como destinatário a empresa locatária, informando o CFOP 5.908, CST 41?

Interpretação

4. De partida, cumpre registrar que o Pronunciamento Técnico 27, do Comitê de Pronunciamento Contábeis (CPC) e a Norma Brasileira de Contabilidade TG 27 (R4), trazem a seguinte definição sobre ativo imobilizado conforme se transcreve:

"Ativo imobilizado é o item tangível que:

(a) é mantido para uso na produção ou fornecimento de mercadorias ou serviços, para aluguel a outros, ou para fins administrativos; e

(b) se espera utilizar por mais de um período." [grifos nossos]

5. Em conformidade com os referidos dispositivos constantes das normas contábeis vigentes, o item destinado à locação (aluguel) a terceiros deve estar devidamente classificado nas contas do ativo imobilizado da empresa locadora. Portanto, no presente caso, a Consulente deve classificar os bens que pretende disponibilizar para locação a terceiros em seu ativo imobilizado. Além disso, deverá proceder ao estorno de eventuais créditos apropriados com fundamento nos artigos 66 e 67 do RICMS/2000. Também vale ressaltar que é necessária a correta classificação desses bens destinados à locação em seus registros fiscais e contábeis, haja vista que a Consulente também mantém estoques de mercadorias da mesma natureza em razão da sua atividade de comercialização envolvendo esses mesmos produtos.

5.1. Nesse contexto, importante destacar que a Consulente deve apresentar mecanismos suficientes para assegurar a distinção, de forma inconfundível e precisa, dos itens classificados como estoque e como bens do ativo imobilizado para locação, através de elementos de controle que assegurem sua classificação (livros, documentos fiscais, sistemas eletrônicos de dados ou qualquer outro método que garanta a perfeita diferenciação, de forma precisa e imediata, dos bens e mercadorias constantes em seu estoque ou ativo imobilizado). Não obstante, observa-se que a Consulente deverá ser capaz de prontamente demonstrar, em eventual caso de fiscalização, a situação fática alegada.

5.2. Nesse prisma, vale elucidar que, se chamada à fiscalização, caberá à Consulente a comprovação por todos os meios de prova em direito admitidos da hipótese fática efetivamente ocorrida. Dessa forma, recorda-se que a fiscalização, em seu juízo de convicção para verificação da materialidade da operação, poderá se valer de indícios, estimativas e de análise de operações pretéritas.

6. Dito isso, cabe, então, analisar a atividade de locação de bens móveis, atividade essa fora do campo de incidência do ICMS, nos moldes do inciso IX do artigo 7º do Regulamento do ICMS (RICMS/2000), mas desde que não utilizada para encobrir negócios de natureza diversa (a exemplo da compra e venda). Nesse ponto, registre-se que a locação de bens está civilmente disciplinada nos artigos 565 e seguintes da Lei 10.406/2002 (Código Civil). Desses artigos decorre que a locação é contrato "pelo qual uma das partes se obriga, mediante contraprestação em dinheiro, conceder à outra, temporariamente, o uso e gozo de coisa não fungível" (Orlando Gomes in "Contratos", Ed. Forense, 18ª ed., pág.274).

7. De acordo com o inciso IV do artigo 569 do mesmo Código, está entre as obrigações do locatário "restituir a coisa finda a locação, no estado em que a recebeu, salvas as deteriorações naturais". Assim, a princípio, salvo situações excepcionais, a restituição do bem ao final do contrato é um dos requisitos essenciais para a configuração da locação. Desse modo, a opção contratual de posterior compra do bem "locado" pelo próprio "locatário" (ou mesmo por terceiros, sublocatários ou comodatários) pode descaracterizar a locação, já que, a depender da situação in concreto, pode demonstrar falta de interesse do locatário na devolução de tal bem, cujo intuito seria de antemão permanecer com o bem como se próprio fosse.

7.1. Frise-se que, findo o contrato de locação, a princípio, o bem deve retornar ao locador, mas não só. Deve retornar, nas condições em que recebeu (salvo pequenas deteriorações) - portanto, em condições de uso, de tal modo que se permita nova locação. Assim, retornado o bem locado, ele não pode estar substancialmente deteriorado, situação em que se denotaria o intuito de cessão definitiva da coisa, desvirtuando, assim, o contrato de locação.

8. Diante disso, na hipótese de uma empresa se utilizar indevidamente da denominação de locação para operações que seriam na verdade compra e venda (venda a prazo, ou a contento, ou com outra cláusula especial), essa operação estará sujeita à incidência do ICMS.

8.1. Recorda-se que esse assunto de locação com intenção de transferência definitiva já foi, inclusive, objeto da Decisão Normativa CAT 03/2000 ("cessão de bens para consumo com a intenção de ser definitiva - Descaracterização do Contrato de Locação").

9. Nesse ponto, em que pese a autonomia da vontade e a livre iniciativa, cabe aos particulares, no exercício regular de suas atividades, zelar pela lisura das práticas negociais, sob a observância da boa-fé e da função social do contrato. Assim, não podem os contribuintes se valerem da utilização formal de negócios jurídicos estruturados apenas no intuito de se ocultarem do dever fundamental de pagar tributos.

10. É nesse sentido que, de acordo com o parágrafo único do artigo 116 do Código Tributário Nacional, a autoridade fiscal tem competência para desconsiderar os atos e negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador da obrigação tributária.

11. Sob essa ótica, recorda-se que os tributos não incidem sobre as disposições contratuais em si, tal como acordado pelas partes, mas sim sobre o fato econômico subjacente. Sendo os contratos meras qualificações jurídicas do fato dadas pelas partes, essa qualificação pode se mostrar precária em relação a terceiros, especialmente em relação ao Fisco, sobretudo quando o fato econômico subjacente não corresponder à qualificação contratual dada pelas partes. Assim, ao procedimento fiscalizatório, cabe a persecução da verdade material subjacente às disposições privadas, isto é, cabe ao Fisco a persecução dos fatos jurídicos que efetivamente tenham ocorrido in concreto. E, em decorrência disso, o referido parágrafo único do artigo 116 permite a desconsideração dos atos e negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador da obrigação tributária.

12. Feitas as considerações quanto ao negócio jurídico pretendido, em se tratando de operações de remessa e retorno de bem do ativo imobilizado em virtude de locação, que, no Estado de São Paulo, estão albergados pela não incidência do ICMS, nos termos dos incisos IX e X do artigo 7º do RICMS/2000, desde que realizadas nos exatos termos do Código Civil, temos que o remetente paulista, locador, (Consulente) deverá emitir Nota Fiscal por ocasião da remessa do bem ao locatário , sem destaque do imposto, consignando o CFOP 5.908 e o código CST 41 ("Não tributada"), tendo em vista a natureza da operação de "remessa de bem por conta de contrato de comodato ou locação".

13. Nessa esteira, ao emitir a Nota Fiscal correspondente à saída de produtos para locação, além dos demais requisitos exigidos pela legislação, a locadora deve informar na Nota Fiscal o valor dos produtos remetidos, conforme disposto no inciso IV do artigo 127 do RICMS/2000, mesmo que a operação não esteja sujeita à incidência do imposto.

14. Relativamente ao código CNAE, esclarece-se que tal classificação constitui-se em uma referência nacional para a identificação da atividade econômica das pessoas jurídicas, nos cadastros e registros da Administração Pública. Ao exercer determinada atividade econômica, ainda que de forma secundária, o contribuinte deve proceder a inclusão em seu respectivo cadastro, conforme disposição prevista no artigo 12, inciso II, alínea "h", do Anexo III da Portaria CAT 92/1998, observado o prazo previsto no § 2º do artigo 29 do RICMS/2000.

Nota:

A Resposta à Consulta Tributária aproveita ao consulente nos termos da legislação vigente. Deve-se atentar para eventuais alterações da legislação tributária.

Base Legal: Resposta à Consulta nº 31.746, de 01/07/2025.
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