Órgão: Consultoria Tributária da Sefaz de São Paulo.

Resposta à Consulta nº 31.356, de 31/03/2025

RESPOSTA À CONSULTA TRIBUTÁRIA 31356/2025, de 31 de março de 2025.

Publicada no Diário Eletrônico em 01/04/2025

Ementa

ICMS - Transferência interestadual de mercadorias - Estabelecimentos do mesmo titular - Estabelecimentos de pessoas distintas - Gado bovino - Convênio ICMS 109/2024.

I. Para a transferência de crédito do ICMS do estabelecimento de origem para o estabelecimento de destino na transferência de bens e mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular, o contribuinte poderá optar pelo regramento trazido pelo §4º do artigo 12 da Lei Complementar 87/1996 (cláusulas primeira à quarta do Convênio ICMS 109/2024), ou, alternativamente, pelo regramento trazido pelo §5º do mesmo artigo, segundo o qual, por opção do contribuinte, a transferência de mercadorias poderá ser equiparada a uma operação sujeita à ocorrência do fato gerador do imposto, realizada com a mesma mercadoria entre estabelecimentos de titulares distintos (cláusula sexta do Convênio ICMS 109/2024).

II. As remessas de estabelecimento rural de produtor para sociedade de produtores rurais com quadro societário distinto ou para sociedade limitada estarão sujeitas às regras gerais do ICMS, devendo ser emitida a Nota Fiscal com destaque do ICMS, se devido, podendo o estabelecimento destinatário se aproveitar de eventual crédito do imposto, se for o caso.

Relato

1. A Consulente, produtora rural pessoa física, que tem como atividade econômica principal declarada no Cadastro de Contribuintes do Estado de São Paulo - CADESP a "criação de bovinos para corte" (CNAE 01.51-2/01), relata que desenvolve atividades rurais (criação e manejo de gado para engorda) em três estados da federação: São Paulo, Mato Grosso e Goiás, com propriedades registradas em seu nome ou em nome de uma empresa limitada, da qual é sócia-proprietária.

2. Citando o artigo 155, II da Constituição Federal, a Súmula 166 do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) no ARE 1255885, entende que a legislação vigente e a jurisprudência consolidada reconhecem que o transporte interestadual de gado entre propriedades de mesma titularidade não configura fato gerador do ICMS, por não haver circulação mercantil ou transferência de propriedade.

3. Desse modo, questiona se o transporte de gado entre as propriedades nos estados citados é isento de ICMS e quais são os documentos necessários para garantir a regularidade do transporte, evitando possíveis autuações fiscais.

Interpretação

4. Preliminarmente, cumpre registrar que a consulta é um meio para que o contribuinte possa esclarecer dúvida pontual e específica acerca da interpretação e consequente aplicação da legislação tributária estadual ao caso concreto, não se prestando a ser salvo-conduto para evitar possíveis autuações fiscais. Considerando a impossibilidade de uma resposta abarcar todas as situações fáticas, cabe à Consulente, se chamada à fiscalização, a comprovação, por todos os meios de prova em direito admitidos, da operação efetivamente ocorrida.

4.1. Adicionalmente, a presente resposta não analisará a regularidade de quaisquer créditos existentes, nem de qualquer procedimento referente à validação ou mesmo ao aproveitamento desses créditos, por não ser competência deste órgão consultivo.

5. Além disso, para efeitos desta resposta, entende-se que a Consulente está respeitando as disposições legais acerca do produtor rural, especialmente o artigo 32 do Regulamento do ICMS (RICMS/2000), e que os estabelecimentos rurais de destino são, de fato, da mesma titularidade da Consulente, tendo inclusive o mesmo quadro societário, assim entendido aquele pertencente aos mesmos titulares, detendo cada um desses titulares a mesma participação em cada um dos estabelecimentos.

5.1. Nesse sentido, vale ressaltar que a sociedade de produtores rurais da qual a sócia é proprietária com outra pessoa física não se caracteriza como estabelecimento rural de mesma titularidade da Consulente.

6. Vale destacar, ainda, que a sociedade limitada, citada no relato, na qual a Consulente tem 50% de participação, não se caracteriza como estabelecimento de produtor rural, nos termos do artigo 32 do RICMS/2000, sendo uma pessoa jurídica distinta, de maneira que seus estabelecimentos não se confundem com os estabelecimentos rurais da Consulente, ou seja, são de titularidades diferentes.

7. Isso posto, observa-se que a natureza da operação de remessa de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular é de transferência, conforme prevê o inciso V do artigo 4º do RICMS/2000.

8. Verifica-se que não há incidência do ICMS sobre as transferências de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular, em decorrência da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal - STF no âmbito da Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 49 (ADC 49).

9. Embora a transferência de mercadoria entre estabelecimentos de mesmo titular não configure fato gerador do ICMS, a autonomia dos estabelecimentos continua a existir no ordenamento jurídico pátrio para os demais fins, tratando-se, portanto, de um fato jurídico apto a produzir outros efeitos tributários que não sejam o surgimento da obrigação tributária principal que seria devida em decorrência de eventual saída destinada a outros contribuintes. É o caso, por exemplo, da própria transferência do crédito do imposto prevista na Lei Complementar 204/2023.

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10. Nesse sentido, lembre-se que a Lei Complementar 204/2023, que incluiu o § 4º ao artigo 12 da Lei Complementar 87/1996, garantiu a manutenção do crédito do ICMS relativo às operações e prestações anteriores em favor do contribuinte, o que se aplica inclusive nas hipóteses de transferências interestaduais, nas quais os créditos serão assegurados pelas Unidades Federadas (UF) de destino e origem.

10.1. Para as transferências interestaduais, na Unidade Federada de destino, os créditos serão assegurados por meio de transferência de crédito, limitada aos percentuais das alíquotas interestaduais cabíveis, aplicados sobre o valor atribuído à operação de transferência realizada, conforme inciso I do § 4º do artigo 12 da Lei Complementar 87/1996.

10.2. Já na Unidade Federada de origem, os créditos serão assegurados em caso de diferença positiva entre aqueles pertinentes às operações e prestações anteriores e o transferido na forma do subitem anterior, conforme o inciso II do § 4º do artigo 12 da Lei Complementar 87/1996.

11. Note-se que a sistemática trazida pelo § 4º do artigo 12 da Lei Complementar 87/1996 garante a manutenção da totalidade do crédito, sendo parte dele devido em face da UF de origem e parte em face da UF de destino. Cada uma dessas UFs deve suportar exatamente o montante de crédito estipulado pela Lei Complementar; nem mais, nem menos.

11.1. Convém enfatizar que, no regramento constante do § 4º da Lei Complementar, não havendo crédito do imposto (por exemplo, no caso de aquisições isentas do ICMS), não há o que se falar em transferência de crédito. A expressão "limitados aos percentuais", trazida no inciso I do § 4º, indica precisamente que caso o montante de crédito relativo às operações anteriores seja inferior ao valor resultante da aplicação do percentual correspondente à alíquota interestadual, apenas o crédito existente será transferido.

12. Não obstante, em razão do disposto no § 5º do artigo 12 da Lei Complementar 87/1996, incluído pela Lei Complementar 204/2023 e cujo veto foi rejeitado pelo Congresso Nacional, o contribuinte passou a poder optar por equiparar a transferência a uma operação sujeita à ocorrência do fato gerador de imposto. Tal opção também implica a transferência dos créditos de ICMS do estabelecimento de origem para o de destino das mercadorias, mas com regramento distinto.

13. Dessa forma, em vez de adotar a sistemática de transferência do crédito constante do § 4º, o contribuinte pode optar pela sistemática do § 5º, que constitui uma equiparação à tributação. Assim, no regime do § 5º, por opção do contribuinte, a transferência da mercadoria produz os mesmos efeitos de uma incidência do ICMS. Nessa hipótese, o débito do imposto na UF de origem e o crédito na UF de destino ocorrerão exatamente como ocorreriam em uma operação com a mesma mercadoria realizada entre estabelecimentos de titulares distintos. A adoção das regras gerais relativas às operações com a mesma mercadoria transferida será efetivada, nesse caso, independentemente de ter havido creditamento nas operações antecedentes.

14. Após a derrubada do veto presidencial ao § 5º do artigo 12 da Lei Complementar 87/1996, foi celebrado no CONFAZ o Convênio ICMS 109/2024, que revogou o Convênio ICMS 178/2023, com efeitos a partir de 1º de novembro de 2024. Nesse contexto, é importante registrar que, no Estado de São Paulo, o Convênio ICMS 109/2024 foi internalizado por meio do Decreto 69.127/2024.

15. Portanto, na transferência de mercadorias, o contribuinte poderá optar por realizar a transferência do crédito da forma prevista nas cláusulas primeira à quarta do Convênio ICMS 109/2024 (artigo 12, § 4º, da Lei Complementar 87/1996) ou por meio da equiparação da transferência de mercadorias a uma operação sujeita à ocorrência do fato gerador do imposto, para todos os fins (cláusula sexta desse Convênio - artigo 12, § 5º, da LC 87/1996).

16. Feitas essas considerações, em relação à situação explicitada nesta consulta, informa-se que, na transferência de mercadorias do estoque dos estabelecimentos rurais paulistas para os Estados de Mato Grosso e Goiás e destes para os de São Paulo, deverá ser emitida Nota Fiscal eletrônica, nos termos previstos no Convênio ICMS 109/2024, tendo como destinatária a propriedade rural na UF de destino, discriminando todos os itens, NCM, unidade de medida, valor unitário, valor total e o CFOP relativo à transferência (6.151 - transferência de produção do estabelecimento), observadas as disposições das cláusulas primeira à quarta e, nesse caso, o disposto no Ajuste SINIEF 33/2024, ou, alternativamente, da cláusula sexta, conforme a opção da Consulente, sem prejuízo das demais condições previstas na legislação.

17. Convém esclarecer que, na hipótese de a Consulente optar pela sistemática prevista no artigo 12, § 4º, da Lei Complementar 87/1996, deverá ser consignado o valor do crédito a ser transferido no campo destinado ao destaque do imposto da NF-e em comento, a cada remessa de mercadorias, conforme previsto na cláusula terceira do Convênio ICMS 109/2024 e no Ajuste SINIEF 33/2024. Nessa hipótese, caso não haja apropriação de crédito do ICMS na entrada em razão de alguma situação prevista na legislação, como isenção na operação anterior sem manutenção de crédito, por exemplo, não haverá crédito do imposto a ser transferido, mesmo em remessas interestaduais, devendo, portanto, ser indicado zero no referido campo dessa NF-e.

18. Por fim, reiteramos que as remessas de gado de estabelecimento rural de produtor da Consulente, para a sociedade de produtores rurais e a sociedade limitada citados anteriormente, por se tratar de remessas de mercadorias entre estabelecimentos pertencentes a pessoas distintas, não estão albergadas pela disciplina da transferência entre estabelecimentos do mesmo titular, conforme estabelecida no artigo 12, §§ 4º e 5º, da Lei Complementar 87/1996 e no Convênio 109/2024, nos termos explicitados acima.

18.1. Nesse caso, as eventuais remessas entre esses estabelecimentos estarão sujeitas às regras gerais do ICMS, devendo ser emitida a Nota Fiscal com destaque do ICMS, se devido, podendo o estabelecimento destinatário aproveitar-se de eventual crédito do imposto, se for o caso.

19. Diante do exposto, consideramos dirimidas as dúvidas apresentadas pela Consulente.

Nota:

A Resposta à Consulta Tributária aproveita ao consulente nos termos da legislação vigente. Deve-se atentar para eventuais alterações da legislação tributária.

Base Legal: Resposta à Consulta nº 31.356, de 31/03/2025.
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