Órgão: Consultoria Tributária da Sefaz de São Paulo.
Publicada no Diário Eletrônico em 06/12/2024
ICMS - Transferência de titularidade de estabelecimento - Estabelecimento terceiro pré-existente que assumirá as atividades do estabelecimento transferido.
I. Na transferência de titularidade do estabelecimento, quando ele permanecer em atividade, os saldos de créditos simples e acumulados do ICMS existentes em sua escrita fiscal continuam válidos e passíveis de aproveitamento.
II. A princípio, para um estabelecimento assumir as atividades de outro, é requerido que haja a transferência de mercadorias e bens do estabelecimento a ser encerrado para aquele que assumirá suas atividades. Tais operações de transferência devem observar o previsto na legislação do imposto (vide artigo 12, §4º e 5º, da Lei Complementar 87/1996, bem como Decreto 68.243/2023 e eventual legislação superveniente).
III. No encerramento do estabelecimento transferido e que teve suas atividades assumidas por outro, o saldo credor de ICMS remanescente na escrita fiscal não pode ser aproveitado (artigo 69, inciso II, do RICMS/2000).
IV. De acordo com o parágrafo único do artigo 116 do Código Tributário Nacional, não é permitido ao particular utilizar-se de meios formais para ocultar a materialidade das operações. Eventuais operações societárias não podem ser utilizadas como subterfúgio para aproveitamento e deslocamento de crédito vinculado ao estabelecimento transferido e que será encerrado.
1. A Consulente, contribuinte enquadrado no Regime Periódico de Apuração (RPA) e que possui como atividade econômica declarada Cadastro de Contribuintes do ICMS - CADESP "Operador de transporte multimodal - OTM" (CNAE 52.50-8/05), ingressa com consulta questionando o entendimento desta Secretaria da Fazenda e Planejamento acerca de operação societária com transferência de titularidade de estabelecimento.
2. Nesse contexto, relata que se encontra em processo de aquisição de empresa terceira, a qual será incorporada pela Consulente. Expõe, ainda, que a empresa incorporada é detentora de créditos de ICMS em razão de sua atividade e que a atividade por ela exercida se identifica com a exercida pela Consulente (incorporadora).
3. Prosseguindo, informa que a empresa incorporadora (Consulente) possui estabelecimento no Município de Guarulhos, ao passo que a incorporada possui, dentre outros, estabelecimento localizado no Município de Barueri. Nesse sentido, está avaliando se continuará com as atividades nos mesmos locais de cada estabelecimento ou se centralizará sua operação em sua filial de Guarulhos.
4. Diante disso, apresenta resumidamente os seguintes questionamentos:
4.1. A empresa incorporadora poderá absorver os créditos de ICMS detidos pela incorporada?
4.2. Se a incorporadora mantiver as atividades dos estabelecimentos transferidos por meio de incorporação, poderá aproveitar o crédito de ICMS?
4.3. Caso, alternativamente, opte por encerrar as atividades dos estabelecimentos transferidos por meio de incorporação, poderá aproveitar o crédito de ICMS? E se, ao invés de encerrar, mantiver o estabelecimento, mas transferir apenas parte de seus ativos, os créditos de ICMS poderão ser aproveitados?
5. Por fim, a Consulente faz menção à Resposta à Consulta Tributária nº 27724/2023 e questiona o entendimento desta Secretaria da Fazenda e Planejamento para os casos de transferência de estabelecimentos em operações societárias a serem realizadas no exercício financeiro de 2024, em virtude da ADC 49 e seus efeitos após 31/12/2023.
5.1. Sobre esse último ponto, a Consulente apresenta seu entendimento de que a decisão do STF deve ser aplicada à operação de incorporação de empresas com transferência de titularidade do estabelecimento. Portanto, haveria vedação constitucional que impede a incidência do imposto em qualquer hipótese de trânsito de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular, ainda que haja extinção do estabelecimento da incorporada ou "unificação" deste com o estabelecimento do incorporador. Sustenta que "a ratio decidendi do Acórdão proferido pela Corte Suprema no Leading Case fixou o entendimento de que não há que se falar em autonomia de estabelecimentos para fins de incidência do ICMS nessa situação".
6. Preliminarmente, observa-se que a Consulente, em seu relato, aparentemente utiliza como sinônimos os termos "saldo credor de ICMS" e "crédito acumulado de ICMS". Na transcrição do relato acima, optou-se por utilizar a denominação "créditos de ICMS", uma vez que, em se tratando de aproveitamento de crédito em operações societárias com transferência de titularidade de estabelecimento, para ambos os tipos de créditos, há o mesmo entendimento.
6.1. Ademais, registra-se que a presente consulta está restrita ao tema de aproveitamento do crédito de ICMS existente na escrita fiscal dos estabelecimentos transferidos por operação de incorporação e que a esses estabelecimentos permanecem vinculados, mas sob a nova titularidade (da empresa incorporadora).
7. Feitas essas observações preliminares, cabe inicialmente tecer algumas explanações acerca da Resposta à Consulta Tributária nº 27724/2023 e os impactos da ADC 49 no entendimento desta Consultoria nas operações de transferência de titularidade do estabelecimento por meio de operações societárias.
8. Nesse ponto, vale pontuar que o STF, ao julgar a Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 49, declarou a inconstitucionalidade dos artigos 11, §3º, II, 12, I, no trecho "ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular", e 13, §4º, da Lei Complementar Federal nº 87/1996. Em face de tal decisão, foram opostos Embargos de Declaração, os quais foram julgados em 19/04/2023, ocasião em que o Plenário da Suprema Corte esclareceu que a declaração de inconstitucionalidade do artigo 11, §3º, II, da Lei Complementar 87/1996 foi parcial, sem redução de texto, limitando-se a excluir do seu âmbito de incidência a cobrança do ICMS sobre as transferências de mercadorias entre estabelecimentos de mesmo titular. Na mesma oportunidade, o STF julgou procedentes os Embargos de Declaração para modular os efeitos da declaração de inconstitucionalidade, de forma que a decisão produza efeitos a partir de 01/01/2024.
8.1. Assim, o entendimento que por fim prevaleceu foi de que o princípio da autonomia dos estabelecimentos se aplica a diversas questões relacionadas ao tributo, de modo que a autonomia dos estabelecimentos não é inconstitucional em si, mas apenas é inconstitucional a aplicação da autonomia dos estabelecimentos para exigir a cobrança de ICMS nas transferências de mercadorias entre estabelecimento do mesmo titular. Ou seja, a autonomia dos estabelecimentos permanece válida e aplicável para todos os demais fins.
8.2. Portanto, em suma, o julgamento final da ADC 49, em relação à autonomia dos estabelecimentos, limitou-se a excluir do seu âmbito a exigência da cobrança do ICMS sobre as transferências de mercadorias entre estabelecimentos de mesmo titular.
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9. No que tange a operações societárias, reitera-se que, embora a transferência de titularidade do estabelecimento tenha relação com a autonomia dos estabelecimentos, não se trata de incidência de ICMS sobre transferência de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular.
9.1. De fato, não há que se confundir transferência de titularidade do estabelecimento com transferência de mercadorias do mesmo titular. São situações fáticas bastante distintas. A transferência de titularidade do estabelecimento trata, por óbvio, de aquisição do estabelecimento como um todo por outro titular, que pode ocorrer por meio de operação societária.
10. Nesse prisma, esclarece-se que a transferência de titularidade do estabelecimento (ainda que essa transferência de titularidade seja realizada por meio de operação societária, como no caso em análise) está regulamentada pelo artigo 3º, inciso VI, da Lei Complementar 87/1996.
11. Assim, importante mencionar que a legislação civil estabelece que é considerado estabelecimento "todo complexo de bens organizado, para exercício da empresa, por empresário, ou por sociedade empresária" (artigo 1.142 do Código Civil). Já, por seu plano, a legislação do ICMS conceitua estabelecimento como "local, público ou privado, construído ou não, mesmo que pertencente a terceiro, onde o contribuinte exerça toda ou parte de sua atividade, em caráter permanente ou temporário, ainda que se destine a simples depósito ou armazenagem de mercadorias ou bens relacionados com o exercício dessa atividade" (artigo 14 do RICMS/2000). Dessa forma, o conceito de "estabelecimento" abrange os bens corpóreos e incorpóreos e, a princípio, inclusive o próprio local físico, organizados para o exercício da atividade empresarial.
12. No caso em análise, a Consulente informa que ocorrerá uma incorporação de empresa, isto é, uma operação societária, com a transferência integral do estabelecimento que antes pertencia à empresa incorporada, passando então para a propriedade da empresa incorporadora. Sendo assim, caso o estabelecimento seja preservado como unidade autônoma, apenas terá alterada sua titularidade. Nesse contexto, ele remanesce desenvolvendo as suas atividades no mesmo local, com os mesmos ativos, os mesmos estoques etc., de modo que apenas a titularidade do estabelecimento é alterada (passando para a empresa incorporadora).
12.1. Nessa situação, como os créditos são vinculados ao estabelecimento, caso o estabelecimento transferido para a empresa incorporadora possua créditos de ICMS em sua escrita fiscal, a empresa incorporadora terá direito a esses créditos. Para tanto, todavia, esse estabelecimento necessita ser mantido operacional enquanto unidade autônoma, isso é, após a alteração da titularidade, o estabelecimento transferido deve, ele mesmo, continuar exercendo normalmente seu objeto operacional.
12.2. Contudo, não é demais ressaltar que, havendo encerramento das atividades do estabelecimento, independentemente de ele ter sido ou não objeto de operação societária anterior, o que se analisará é o disposto no artigo 69, inciso II, do RICMS/2000, que trata de vedação ao crédito.
12.3. Assim, eventual operação societária de incorporação não pode ser utilizada como pretexto para encerramento material do estabelecimento transferido, com deslocamento do saldo credor existente para outro estabelecimento, caso em que se aplica o disposto no inciso II do artigo 69 do RICMS/2000 ("ressalvadas disposições em contrário, é vedada a restituição ou a autorização para aproveitamento de saldo de crédito existente na data do encerramento das atividades de qualquer estabelecimento").
13. Nesse ponto, vale observar que a Consulente estuda transferir as atividades do estabelecimento transferido para outro, pré-existente, já de titularidade da empresa incorporadora. Essa situação implica em desativação da unidade transferida. Nesse sentido, cumpre ressaltar que, ainda que suas atividades sejam absorvidas por outro estabelecimento, a unidade transferida, enquanto estabelecimento independente, deixará de existir. Desse modo, o estabelecimento adquirido pela empresa incorporadora será descontinuado, isto é, não se manterá em atividade enquanto unidade autônoma, sendo, portanto, material e formalmente, encerrado.
13.1. Cabe, todavia, registrar que o entendimento acima exposto não é exclusivo ao tema de operações societárias (no caso, incorporação de empresas). Isso é, ainda que o estabelecimento já fosse de titularidade da empresa que o adquiriu, na medida em que ele é encerrado (ainda que suas atividades sejam absorvidas por outro estabelecimento), o aproveitamento dos créditos vinculados a ele e remanescentes em sua escrita fiscal estaria vedado, por conta da aplicação do inciso II do artigo 69 do RICMS/2000 (cuja aplicação independe de ter havido ou não operação societária anterior, ressalta-se).
14. Não obstante, salienta-se, que, a princípio, para um estabelecimento assumir as atividades do outro, é requerido que haja a transferência de mercadorias e bens do estabelecimento a ser encerrado para aquele que assumirá suas atividades. Essas operações devem observar as normas usuais de transferência de mercadorias e bens previstas na legislação do ICMS, ressaltando-se que, conforme redação atual do artigo 12, § 4º, da Lei Complementar 87/1996, não se considera ocorrido o fato gerador do imposto na saída de mercadoria de estabelecimento para outro de mesma titularidade, mantendo-se o crédito relativo às operações e prestações anteriores em favor do contribuinte. A utilização desses créditos, bem como sua transferência, nas hipóteses admitidas, deverá observar o previsto na legislação do imposto (vide Decreto 68.243/2023 e eventual legislação superveniente).
14.1. Assim, caso pretenda continuar desenvolvendo as atividades do estabelecimento que será encerrado, após finalização processo de incorporação de empresas, mas antes do encerramento das atividades do estabelecimento recém transferido, a sociedade poderá transferir as mercadorias e bens do ativo imobilizado para o estabelecimento da incorporadora, devendo observar as normas usuais de transferência de mercadorias e bens previstas na legislação do imposto, conforme posto no item 14 acima.
14.2. Nesse cenário, como haverá continuidade operacional do estabelecimento enquanto unidade autônoma, recomenda-se a leitura da orientação geral acerca dos procedimentos operacionais para os casos de sucessão societária com continuidade operacional do estabelecimento, disponibilizada no portal desta Secretaria da Fazenda e Planejamento em:
https://portal.fazenda.sp.gov.br/servicos/cadesp/Paginas/Opera%C3%A7%C3%B5es-de-Sucess%C3%A3o.aspx
15. Dessa feita, considerando a situação em estudo em que ocorre a transferência da propriedade do estabelecimento e o subsequente encerramento do estabelecimento anteriormente pertencente a empresa incorporada e, consequentemente, de todas as suas atividades, ocorrendo, assim, a sua desativação, a empresa incorporadora não poderá aproveitar o crédito que pertencia ao estabelecimento outrora existente depois de efetivado o seu encerramento material. Portanto, o saldo credor de ICMS remanescente na escrita fiscal após a eventual transferência de bens e mercadorias, por regra, não pode ser aproveitado (artigo 69, inciso II, do RICMS/2000).
15.1. Ademais, ao proceder a desativação do estabelecimento transferido, com o encerramento de suas atividades, a Consulente deverá observar os termos do artigo 3º, inciso I c/c artigo 182, inciso VI, ambos do RICMS/2000, com a consequente emissão de Nota Fiscal Eletrônica (NF-e), com incidência do imposto relativamente às mercadorias porventura remanescentes em estoque final do estabelecimento que encerra suas atividades, considerando a data do encerramento do estabelecimento. Deverá, ainda, obedecer às demais normas regulamentares sobre o encerramento das atividades de um estabelecimento.
16. Por fim, cabe ainda recordar que, de acordo com o parágrafo único do artigo 116 do Código Tributário Nacional, não é permitido ao particular utilizar-se de meios formais para ocultar a materialidade das operações. Desse modo, se porventura verificada na situação concreta a utilização formal de atos e negócios jurídicos estruturados desprovidos de propósito negocial para, assim, suprimir a real materialidade da operação, então, esses serão passíveis de desconsideração pela autoridade administrativa. Conclui-se, então, que a operação societária não pode ser utilizada como subterfúgio para apropriação e aproveitamento de crédito que de outro modo não teria direito. Isso é, a operação societária com transferência de estabelecimento não pode ser utilizada como mero pretexto para deslocamento do saldo credor existente no estabelecimento transferido para outro estabelecimento, caso em que se aplicaria o disposto no inciso II do artigo 69 do RICMS/2000.
17. Nesses termos, consideram-se respondidos os questionamentos efetuados pela Consulente.
Nota:
A Resposta à Consulta Tributária aproveita ao consulente nos termos da legislação vigente. Deve-se atentar para eventuais alterações da legislação tributária.
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